Exposição de miniaturas apresenta outra face da Bahia
Da mistura do barro, com a madeira, mas principalmente da porcelana fria, surgem obras em miniaturas realistas que fazem as pessoas se transportarem para pequenos ambientes do cotidiano. Aquela venda de frutas, um manguezal, o antigo bar no centro da cidade, assim são as obras da exposição “Duas Lembranças”, do miniaturista, soteropolitano e apaixonado pela terra, Leo Furtado, e da artista plástica Cibele Sales. A mostra está em cartaz no Salão do Palácio Rio Branco, em Salvador, até dia 30 de setembro, das 10h às 17h30.
Há mais de 10 anos, enquanto batalhavam em eventos, exposição e feiras de arte, Cibele e Leo se conheceram e viram que seus trabalhos tinham muito em comum. “Eu nunca fui de ter parcerias porque a leitura do miniaturista é muito solitária, mas Cibele também tem essa característica de representar a Bahia e vimos que podíamos juntar nossos trabalhos”, conta Leo Furtado. Juntos eles construíram o Estúdio Furtado Sales, que tem sede no Forte do Barbalho, e foi de lá que veio o convite para fazer uma exposição no Palácio Rio Branco.
Como o nome já diz, a exposição é baseada nas lembranças dos dois artistas baianos. “A gente convive com tudo isso aí. Eu sou apaixonado por minha cidade. Estar aqui no centro histórico, nesse salão que é extremamente lindo, está sendo mais que gratificante. É uma experiência diferente”, diz Furtado. As obras chamam atenção pela riqueza de detalhes e pela realidade dos cenários. “O mais interessante do meu trabalho é ver as pessoas se reconhecendo ou descobrindo a Bahia. Acho que esse é o meu diferencial com relação aos outros miniaturistas”, afirma o artista.
Natural de Cachoeira, no Recôncavo Baiano, Cibele Sales também cria esculturas inspiradas no dia a dia, com destaque para personagens do candomblé. “A minha relação com os orixás e as baianas é muito forte. Eu sou umbandista e coloco isso nas minhas peças”. Ela também diz se sentir realizada em ter suas obras expostas no Palácio. “Precisamos incentivar ainda mais as exposições, porque hoje em dia elas têm acontecido muito menos, e são um incentivo pra nós artistas”.
Os dois artistas tiveram a colaboração do alagoano Ozano Pereira, aprendiz da dupla que também se inspira na vivência para dar forma às peças. “É com muito orgulho que vejo minha obra exposta aqui. Me dá ainda mais vontade de continuar. Fazer isso tem sido uma terapia, me faz bem”, confessa Pereira.
No estúdio, Cibele e Leo criam individualmente e a quatro mãos, e avisam: aceitam encomendas. A dupla mantém uma exposição permanente no Forte do Barbalho, com peças religiosas inspiradas na Irmandade da Boa Morte e no candomblé. Juntos há tanto tempo, fazem planos para o futuro: querem retratar momentos históricos da Bahia. Para mexer com o imaginário popular, sonham em criar um presépio com algumas das figuras mais interessantes da cultura do Estado, a exemplo da Mulher de Roxo e Irmã Dulce.
Um miniaturista “baianista”
Leo Furtado não esconde o amor por sua cidade e pela cultura baiana. “O ‘Baianismo’, e uso essa expressão para dar mais ainda essa ideia de nacionalismo, é algo tão rico, tão maravilhoso”, diz. Formado em desenho industrial, é também militar e músico. Sua história com miniaturismo começou com uma viagem da irmã aos Estados Unidos. Ela trouxe de lá uma peça bem pequena e ele conta que foi amor à primeira vista.
“Assim que vi, logo pensei em fazer um ambiente para ela. Fiz uma pesquisa, não sabia nada de escalas. De lá pra cá já são mais de 20 anos fazendo esse trabalho”. Leo integra vários grupos de miniaturista e recentemente atuou como diretor de arte e cenógrafo na produção baiana Òrun Àiyé, filme curta em “stop motion” que narra à criação do mundo na visão dos orixás (Estandarte Produções). “Foram dois anos de processo. Uma experiência muito interessante. O filme foi tão bem recebido que pretendemos fazer o segundo”, afirma. Leo trabalhou ao lado do músico Carlinhos Brown, que dubla um dos personagens do filme.
A criadora de gentes
Veterana das exposições, há mais de 30 anos Cibele começou a trabalhar com artes plásticas e artesanato. Já fez várias exposições em diversas instituições do Estado, como Tribunal de Justiça, Bahiatursa e Instituto Mauá. Ela conta que o chama a atenção em seu trabalho é sua originalidade, pois cria “pessoas pequeninas”. “Faço peças 100% artesanais, ou seja, tudo feito por mim. Não é repetitivo, nunca um personagem é igual aos outros, são várias pessoas diferentes e isso não torna o trabalho monótono”, ressalta.
Cibele é uma artista autodidata. Começou a fazer as obras de forma precária, sem muito dinheiro e ensinamentos. Quando conheceu a porcelana fria deu uma reviravolta no seu modo de confeccionar. Buscou inspiração nas suas lembranças e no seu imaginário, mas sem deixar de produzir por encomenda. Seu principal traço se revela nas baianas e orixás. Mas ela também gosta de criar vendedores, lavadeiras e quituteiras. Na visão da artista, o artesanato atravessa uma fase difícil, mas assegura que continuará produzindo e criando. “Eu amo o que faço”, defende.
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Por Ascom/Secult