Flip 2017 concentra-se na literatura e no diálogo entre as artes, em edição que reúne autores de fora do centro
Pela primeira vez, programa terá número de autoras mulheres superior ao de homens; autores negros chegam a 30% da programação.
Na Flip que tem Lima Barreto (1881-1922) como Autor Homenageado, a pluralidade de gêneros em que exerceu o ofício – da reportagem ao romance, da crônica à memória e ao diário – e as questões que atravessaram sua obra – como a étnico-racial, a do artista como militante e a da etnografia da cidade – perfazem o programa, com um total de 22 mesas e 46 autores (22 homens e 24 mulheres) a se realizar entre 26 e 30 de julho, em Paraty.
A busca por autores múltiplos e renovadores da linguagem como Lima Barreto — um moderno antes dos modernistas – foi um dos eixos da curadoria, assim como a própria noção de subúrbio – não apenas o subúrbio literal, registrado pelo olhar do autor sobre o Rio de Janeiro periférico, mas o subúrbio como sinônimo do que não está no centro, na acepção mais ampla possível. Também há um número expressivo de autores que atuam em campos artísticos como a música, o vídeo, o cinema e o teatro.
AUTORES CONVIDADOS
Neste ano, a Flip promove o encontro inédito do jamaicano Marlon James e do americano Paul Beatty, dois autores negros que venceram, em dois anos consecutivos (2015 e 2016), o Man Booker Prize, o prêmio mais prestigioso da língua inglesa.
A Paraty chegam também a chilena Diamela Eltit, autora experimental que é um dos mais importantes nomes das letras hispano-americanas; o repórter da New Yorker William Finnegan, que cobriu conflitos na África e acaba de vencer o Pulitzer com suas memórias como surfista; a argentina Leila Guerriero, um dos grandes nomes do jornalismo narrativo na América Latina ao preferir a periferia e os coadjuvantes, e não o centro e os protagonistas; o francês Patrick Deville, escritor-viajante que, entre o Camboja e o México, pratica o que chama de romance de não ficção; a britânica da África do Sul Deborah Levy, que escreve peças, contos e romances com astúcia e originalidade; a ruandesa Scholastique Mukasonga, com suas comoventes memórias e romances sobre seu país natal, cenário de um genocídio em 1994; o islandês Sjón, apontado como o grande romancista do norte europeu e letrista de sucesso em parcerias com Björk, indicado ao Oscar pela trilha do filme Dançando no Escuro (2000), de Lars von Trier; o rapper e ativista Luaty Beirão, trazendo sua experiência artística com o português de Angola.
“Nos suplementos e revistas literárias internacionais, existe já certo consenso de que há uma nova geração de autores que, apesar de trajetórias sólidas, estão aparecendo agora e vão de certo modo se tornar centrais na próxima década. Estamos contentes de trazer alguns desses nomes a Paraty”, diz a curadora Joselia Aguiar. “Ao mesmo tempo, esta edição de 2017 traz nomes que poderiam ser mais conhecidos faz tempo por aqui e surpreendentemente ainda não tinham sido traduzidos”.
Em diálogo com as artes e a ciência, o programa reúne ainda Carlos Nader, videoartista, diretor e documentarista que, ao cruzar linguagens e desafiar rótulos, recebeu diversos prêmios; Niéde Guidon, a mais importante arqueóloga do país, à frente do Parque Nacional da Serra da Capivara e da teoria de que o homem chegou à América muito antes do que se diz.
A tradição greco-latina é representada pelos poetas e tradutores de clássicos Guilherme Gontijo Flores e Frederico Lourenço. O programa contará ainda com autores cuja obra e atuação envolvem línguas e culturas ameríndias e africanas. Do Brasil, somam-se o pensador indígena Álvaro Tukano, o romancista Alberto Mussa, os poetas multimídia André Vallias e Ricardo Aleixo, a romancista e poeta Conceição Evaristo, o poeta e ensaísta Edimilson de Almeida Pereira, o historiador e cronista Luiz Antonio Simas, a poeta e tradutora Josely Vianna Baptista.
“Esperamos que o aumento de autoras e autores negros no programa seja um ponto de virada e que a Flip possa influenciar não apenas outras programações literárias do país, mas o próprio mercado editorial, ajudando a torná-lo mais diverso”, afirma a curadora. “De nenhum modo esgotamos nesta edição de 2017 o número de autores e autoras negros e afrodescendentes importantes, vários com trajetórias de décadas e outros tantos novíssimos.”
ABERTURA E AUTOR HOMENAGEADO
Na abertura, o ator e escritor Lázaro Ramos dará voz a Lima Barreto em apresentação criada por Lilia Schwarcz, com direção de cena de Felipe Hirsch.
A obra do autor será discutida diretamente em mais três mesas: “Arqueologia de um autor” tratará de seu lugar no cânone literário; “Moderno antes dos modernistas” irá discutir as peculiaridades de sua linguagem; “Subúrbio” abordará as discussões urbanísticas presentes em sua obra.
Outras cinco mesas estão relacionadas a Lima Barreto: “Aldeia”, título da tradicional mesa Zé Kleber, tratará de território e sociabilidade em comunidades quilombolas e indígenas fora dos centros urbanos; “Fuks & Fux” tem como um dos temas a autoficção; “Kanguei no Maiki – Peguei no microfone” relaciona literatura e militância; “Foras de série” relembra personagens reais que, assim como o autor de Triste fim de Policarpo Quaresma, se distinguiram em histórias de invenção e liberdade. “Trótski e os trópicos”, entre os assuntos abordados, registra os ecos da revolução russa que chegaram até o Autor Homenageado.
NOVOS FORMATOS
Pela primeira vez, a Flip apresentará uma série de intervenções poéticas intitulada “Fruto Estranho”, em que, individualmente e durante quinze minutos, seis autores vão se apresentar antes de seis mesas ao longo do programa. O nome da série remete à música imortalizada por Billie Holiday (“Strange Fruit”) e ao fato de cada autor trabalhar com formas híbridas – combinações de poesia, fotografia, vídeo, performance, teatro. São eles, em ordem alfabética: Adelaide Ivánova (performance com fotografia), André Vallias (poema digital), Josely Vianna Baptista (videopoema), Grace Passô (dramaturgia), Prisca Agustoni (poéticas in fioritura), Ricardo Aleixo (performance multimídia).
INTELECTUAIS NEGRAS
A convite da curadoria da Flip, o Grupo Intelectuais Negras UFRJ lançará em Paraty, durante a festa literária, a obra Intelectuais Negras. Trata-se de um catálogo-portfólio que reúne informações biográficas e profissionais de mulheres negras atuantes em todo o Brasil. O lançamento ocorrerá dentro da programação da Casa Amado e Saramago, no sábado, dia 29/07.
Flip 2017
A 15ª edição da Flip, com curadoria de Joselia Aguiar, homenageia Lima Barreto.
Patronos 2017
O Programa de Patronos é um plano de mecenato voltado a pessoas físicas que apoiam a realização da Festa Literária Internacional de Paraty.
Além de contribuir para a viabilização dos 5 dias de evento, o patrono fomenta as ações educativas de permanência promovidas pela Flip no território.
Os benefícios incluem ingressos para a Programação Principal da Flip, convites para o coquetel de boas-vindas com a participação dos autores, e encontros com a curadora e com o diretor-executivo da Casa Azul, entre outras atividades.
Mais informações pelo e-mail patronos@casaazul.org.br.
Quem faz a Flip
A Casa Azul é uma organização da sociedade civil de interesse público e sem fins lucrativos que desenvolve projetos nas áreas de arquitetura, urbanismo, educação e cultura. Há mais de vinte anos, desenvolve ações capazes de potencializar transformações no território, a exemplo da Flip. Em Paraty, onde a associação se originou, esse processo levou à realização de ações de permanência, como a Biblioteca Casa Azul e o Museu do Território de Paraty, que seguem em funcionamento durante todo o ano.
Patrocínio
A programação da Flip é realizada por meio da lei de incentivo à cultura do Ministério da Cultura do Governo Federal e conta com patrocínio do Itaú, da EDP e de outras empresas e organizações em vias de captação.
PROGRAMA COMPLETO DA FLIP 2017
quarta-feira
- 19h15 Mesa 1 – Sessão de abertura – Lima Barreto: triste visionário
Vida e obra de Lima Barreto são apresentadas nesta aula ilustrada, comparando o Brasil que viu em sua época e o futuro que previa, com leituras e imagens inéditas de uma nova biografia.
Lázaro Ramos
Lilia Schwarcz
dir.: Felipe Hirsch
- Mesa móvel: Fruto estranho
Seis autores realizam intervenções poéticas por meio de formas híbridas –poesia, fotografia, vídeo, performance, teatro – com duração entre 10 a 15 minutos, distribuídas pela programação.
Adelaide Ivánova
André Vallias
Grace Passô
Josely Vianna Baptista
Prisca Agustoni
Ricardo Aleixo
Quinta-feira
- 10hterritório Flip | Flipinha – Mesa Zé Kleber: Aldeia
A convivência e a fruição do território que vêm de sabedorias ancestrais são os principais temas desse diálogo entre três pensadores líderes de suas comunidades – dois indígenas e uma quilombola – que têm cada vez mais ressonância em todo o país.
Álvaro Tukano
Laura Maria dos Santos
Ivanilde Kerexu Pereira
- 12hMesa 2: Arqueologia de um autor
Entre a paixão e a minúcia, recupera-se a obra dispersa de um autor à margem e se define o lugar de Lima Barreto entre os clássicos e no cânone afro-brasileiro, nesta conversa que soma história e crítica literária.
Beatriz Resende
Edimilson de Almeida Pereira
Felipe Botelho Corrêa
- 15h Mesa 3: Pontos de fuga
[Fruto Estranho: Josely Vianna Baptista]
Três premiadas vozes da novíssima literatura em língua portuguesa falam de suas influências, técnicas e experiências: como lidam com a tradição e a renovam, seus modelos e perspectivas.
Carol Rodrigues
Djaimilia Pereira de Almeida
Natalia Borges Polesso
- 17h15 Mesa 4: Fuks & Fux
A autoficção é um dos eixos deste diálogo, bem como as parcerias e rivalidades na história da literatura. Como pano de fundo, imigração, resistência, vanguarda francesa, matemática.
Julián Fuks
Jacques Fux
- 19h15 Mesa 5: Odi et amo
[Fruto Estranho: Grace Passô]
A tradição greco-latina, seus mitos, poesia e narrativas, a Bíblia grega, a literatura e a cultura medieval: nesta conversa entre dois grandes tradutores do latim e do grego, tem-se uma breve história das ideias e dos sentimentos do Ocidente.
Frederico Lourenço
Guilherme Gontijo
- 21h30 Mesa 6: Em nome da mãe
Histórias de guerras e de sobrevivência, de invenções e reconstruções artísticas a partir do ponto de vista feminino, no encontro entre uma brasileira filha de uma sobrevivente de Auschwitz e de uma ruandesa tutsi que perdeu a família no genocídio e é influenciada pela literatura do holocausto.
Noemi Jaffe
Scholastique Mukasonga
Sexta-feira
- 10hterritório Flip | Flipinha – A pele que habito
As identidades e as relações de cor nos países da lusofonia são o principal tema desta conversa, que parte da trajetória artística de um ator de sucesso no Brasil e uma jornalista portuguesa autora de premiado livro-documentário sobre o racismo em português.
Joana Gorjão Henriques
Lázaro Ramos
- 12h Mesa 7: Moderno antes dos modernistas
A singularidade da linguagem de Lima Barreto é evidenciada a partir de sua aversão ao bacharelesco e da visão da arte como militância, na sua escrita para jornal e nos diários do hospício. No debate, são lembrados autores que foram seus contemporâneos e autores posteriores sob sua influência.
Antonio Arnoni Prado
Luciana Hidalgo
- 15h Mesa 8: Subúrbio
[Fruto Estranho: Prisca Agustoni]
Uma visita aos lugares por onde Lima Barreto passou no Rio de Janeiro, com seus personagens de crônicas, contos e romances, seguindo a linha do trem e arrabaldes de ontem e hoje, a etnografia e a poética das ruas, a partir de dois olhares: o de uma especialista em sua obra e em literatura contemporânea e o de um historiador que entende de Ifá, encantados, samba e cultura popular carioca.
Beatriz Resende
Luiz Antonio Simas
- 17h15 Mesa 9: Na contracorrente
A resistência feminina e os projetos realizados em campos periféricos da cultura e da ciência: neste encontro-depoimento, tem-se a trajetória de uma dos maiores nomes da arqueologia no mundo, a partir do Piauí, e de uma espanhola presidenta de uma instituição que tem como bandeiras a literatura em língua portuguesa, os direitos humanos e o meio-ambiente.
Niéde Guidon
Pilar del Río
- 19h15 Mesa 10: A contrapelo
[Fruto Estranho: Ricardo Aleixo]
Uma escritora experimental chilena referência na crítica feminista e um refinado documentarista brasileiro, que contou a trajetória do poeta Wally Salomão e do pintor Leonilson, conversam sobre linguagens na fronteira e resistência artística.
Carlos Nader
Diamela Eltit
- 21h30 Mesa 11: Por que escrevo
Um jornalista que cobriu conflitos na África e que, nas horas vagas, praticava obsessivamente o surf e fez dessa experiência um premiado livro de memórias se encontra com uma escritora nascida na África do Sul do apartheid: uma conversa sobre as diferentes motivações de um escritor e a entrega ao ofício.
Deborah Levy
William Finnegan
sábado
- 10hterritório Flip | Flipinha – VOCO
Improvisações vocais entremeadas a poemas com interação do público. Sem se dar conta, as pessoas passam por uma série de procedimentos vocais extraídos tanto do contexto da música e da poesia experimentais quanto das práticas ritualísticas africanas e ameríndias. Efeitos eletrônicos, como os de pedais, são usados para a diversão das crianças.
Ricardo Aleixo
- 12h Mesa 12: Foras de série
Personagens singulares da história e da literatura brasileiras, como ex-escravos que triunfaram e mulheres revolucionárias no Brasil do século 19, permeiam este debate sobre vozes dissonantes e as técnicas de pesquisa e escrita que reúne uma romancista e um historiador da escravidão – a invenção da liberdade até chegar ao período do pós-abolição de Lima Barreto.
Ana Miranda
João José Reis
- 15h Mesa 13: Kanguei no Maiki – Peguei no microfone
[Fruto Estranho: Adelaide Ivánova]
O ativismo e a literatura — ao gosto de Lima Barreto —, a resistência e a liberdade: eis o pano de fundo da conversa entre um rapper que fez um diário da prisão em Angola quando foi preso com livros considerados subversivos e uma escritora que, entre indas e vindas ao exterior, se dedicou à educação popular no sertão durante a ditadura.
Luaty Beirão
Maria Valéria Rezende
- 17h15 Mesa 14: Mar de histórias
Borges é o ponto comum entre os dois autores, um da Islândia e outro do Rio, que conversam sobre contos de fada, mitologias, narrativas antigas que viajam e surrealismo.
Alberto Mussa
Sjón
- 19h15 Mesa 15: Trótski e os trópicos
[Fruto Estranho: André Vallias]
Os limites da ficção e da não ficção, os protagonistas e os coadjuvantes, o local e o global são os temas desta conversa entre um escritor viajante francês e uma jornalista que, baseada na Argentina, escreve para toda a América Latina.
Leila Guerriero
Patrick Deville
- 21h30 Mesa 16: O grande romance americano
Dois autores de uma mesma editora independente venceram, em anos sucessivos, o mais prestigioso prêmio de língua inglesa, o Man Booker Prize (2015 e 2016). Esta conversa revelará em que medida renovam a tradição a partir do seus pontos de vista particulares, a de um americano negro e a de um jamaicano negro que migrou para os EUA, onde ambos lecionam escrita criativa.
Marlon James
Paul Beatty
domingo
- 10hterritório Flip | Flipinha – Ler o mundo
Aprender a olhar e escutar pelos livros infantis: duas escritoras brasileiras e um poeta e escritor negro conversam sobre leitura e olhares que lançam ao mundo e levam a suas obras para esse público.
Ana Miranda
Edimilson de Almeida Pereira
Maria Valéria Rezende
- 12h Mesa 17: Amadas
Ao refazer sua trajetória com imagens e leituras, Conceição Evaristo, em conversa com Ana Maria Gonçalves, presta um tributo a outras vozes femininas africanas e da diáspora negra, como Angela Davis, Audre Lorde, Carolina de Jesus, Josefina Herrera, Nina Simone, Noêmia de Sousa, Odete Semedo, Paulina Chiziane e Toni Morrison.
Ana Maria Gonçalves
Conceição Evaristo
- 15h Mesa 18: Livro de cabeceira
Na sessão de despedida da Flip, conduzida tradicionalmente por Liz Calder, autores convidados leem trechos de seus livros prediletos.
Por Ascom / Flip 2017