Congresso quer colocar a juventude na cadeia, ressuscitar pautas medievais e atropelar a democracia brasileira.

Quem assistiu às últimas sessões da câmara dos deputados ou mesmo do senado federal deve estar se perguntando como tantas questões já superadas e a troco de muitas lutas do povo brasileiro podem estar sendo revisitadas e colocadas novamente em pauta. Podemos citar aqui a questão da redução da maioridade penal presididas pelo Algoz da juventude Eduardo Cunha, do PMDB do Rio de Janeiro, e isso deve nos indignar ou no mínimo perguntar o porquê de tanto interesse em criminalizar a juventude de menos de 18 e maior de 16 anos. O que ocorre é que em sessão anterior desta mesma câmara, menos de 24 horas antes, este mesmo plenário rejeitou a proposta da maioridade penal para jovens de 16 anos. Cunha e o grupo de deputados favoráveis nos direitos de manobras que a casa permite, retornou na mesma sessão, com o assunto travestido de emendas aglutinativas quando na verdade estavam votando o mesmo tema, só que com outras palavras, justamente para enganar a opinião publica.
O que está por trás disso tudo é que “Muitos deputados têm financiamento de gestores de penitenciárias privadas e empresas de segurança. Estamos falando de muito dinheiro”. O fato é que a violência mata mais os adolescentes do que qualquer outra camada da população. E, ao contrário do argumento usado por quem defende a redução da maioridade penal, não são eles os que mais matam, “A percepção social de que os adolescentes são os grandes responsáveis pela violência no Brasil não resiste à análise acurada”. Os jovens entre 15 e 19 anos são as maiores vítimas da violência fatal e cometem apenas uma parcela destes crimes.
Os homicídios são a principal causa de morte de jovens de 15 a 29 anos no Brasil e atingem especialmente jovens negros do sexo masculino, moradores das periferias e áreas metropolitanas dos centros urbanos, constata o Mapa do Encarceramento: Os Jovens do Brasil, da Secretária-Geral da Presidência da República. O relatório, ainda em versão preliminar, é baseado em dados consolidados do SIM/Datasus, do Ministério da Saúde, sobre as 56.337 vítimas de homicídio em 2012. Mais da metade delas, 52,63%, eram jovens (27.471), dos quais 77% negros (pretos e pardos) e 93,30% do sexo masculino. E apesar de, esporadicamente, acontecerem crimes envolvendo adolescentes que sensibilizam a opinião pública, como o recente caso do médico Jaime Gold esfaqueado na Lagoa, no Rio de Janeiro, uma parcela ínfima comete crimes violentos. De acordo com uma estimativa do Unicef Brasil (feita a partir de dados da Pnad e Sinase de 2012) e citada em nota da ONU contra a redução da maioridade penal “dos 21 milhões de adolescentes que vivem no Brasil, apenas 0,013% cometeram atos contra a vida”.
Confirmando outra percepção, a nota da ONU afirma: “Há inúmeras evidências de que as raízes da criminalidade grave na adolescência e juventude no Brasil se desenvolvem a partir de situações anteriores de violência e negligência social. Essas situações são muitas vezes agravadas pela ausência do apoio às famílias e pela falta de acesso destas aos benefícios das políticas públicas de educação, trabalho e emprego, saúde, habitação, assistência social, lazer, cultura, cidadania e acesso à justiça, que, potencialmente, deveriam estar disponíveis a todo e qualquer cidadão, em todas as fases do ciclo de vida”.
Onde deveriam estar estes jovens de 12, 14 e até 18 anos? Sim, amigos, estes deveriam estar estudando em escolas de tempo integral, em aulas de teatro e musica, no trabalho de ofício com os pais, ou algo do tipo. Mas não, estes jovens estão nas esquinas de todas as cidades do Brasil, por que isso ocorre? Estes jovens nasceram nas esquinas destas ruas, foram educados para estarem lá pelas mãos imundas do trafico e pela falta de capacidade do estado capitalista de proporcionar uma vida digna a todos. Aqui o problema não é de governos, mas sim do sistema de organização da sociedade, onde o capitalismo precisa que parte da população seja de fato excluída e explorada.
Não podemos tratar o problema da criminalidade entre os jovens como sendo este o mentor de toda a violência que existe. Diga então quem é mais bandido, um deputado filho da “p” engravatado que rouba da nação milhões ou um jovem que herdou a violência deste próprio estado excludente, e que este mesmo deputado tinha a obrigação de corrigi-lo. Pera aí, me parece que o negocio é mais embaixo. Hoje está sendo com as crianças e adolescentes de 16, quem nos garante que amanha não será com os de 14 ou de 12, ou até mesmo começarem a matar as crianças no ventre das mães, porque algum método cientifico maluco pode apontar para isso?
A lei brasileira vai mais fundo, garantindo atendimento prioritário aos direitos de crianças e adolescentes na forma exigida pelo Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), promulgado em 1990. Na prática, porém, não apenas o Estado falha em garantir “um mínimo para esses meninos” em um país profundamente desigual, mas é ele que faz girar a roda de violência através de seu aparelho repressivo, como aponta Fernanda Laender, educadora no Centro de Direitos Humanos e Educação Popular de Campo Limpo. “A violação do Estado produz ‘vítimas’ e estas, quase sempre, se tornam ‘agressores’. É a reprodução da dinâmica da violência. No fundo, eles buscam igualdade, ter os mesmos direitos que os outros, e a violência é a forma mais ‘naturalizada’ de reivindicação.
Existe um atravessamento do Estado na vida destes meninos e suas famílias, mantendo as coisas em seus ‘devidos lugares’. Pobres e negros cada vez mais pobres e excluídos. Os meninos não se tornam traficantes, eles crescem em meio ao tráfico e ao crime, mas vivem o mesmo apelo social de uma sociedade de consumo em que você é o que você tem. Os meninos querem isso também, ter coisas, ser alguém, experimentar o que é pertencimento e ser reconhecidos. Quando o Estado se mostra presente nas políticas públicas periféricas, se apresenta numa perspectiva policial e penitenciária, ou seja, policial e punitiva.”
Esta forma de atendimento à população, inclusive aos jovens, não atende às demandas de toda uma sociedade. O que os jovens precisam é de educação, saúde, moradia, lazer dentre tantos outros direitos.
A violência policial, jurídica, política é a consequência de uma sociedade doente e que não aprendeu a forma do bem estar social das suas populações. Vivemos certamente os últimos suspiros desta lógica capitalista de destruição, onde uma forma mais justa e humana de vida é necessária, seja ela o socialismo, o cristianismo, ou qualquer outra coisa, o que não se pode mais é ver jovens de 14 e 16 anos morrendo nas mãos do estado por soldados armados e autorizados para matar.
Para que mora em IGUAÍ, esta certamente é uma realidade bastante brutal. Segundo dados levantados pela Secretaria de Segurança Publica do Estado da Bahia, nos últimos 3 anos mais de 100 pessoas foram assassinadas em todo o município e destas pelos menos metade, 50% eram jovens entre 15 e 18 anos, e o mais grave é que em 3 anos ninguém em Iguaí foi preso por homicídio.
Então a realidade não está tão distante e precisamos ver de fato onde esta o problema. Eu prefiro acreditar que está na falta de políticas públicas adequadas e formas mais inteligentes de vida.
“Contra a intolerância dos ricos, a intransigência dos pobres” (Florestan Fernandes)
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Por José Ronaldo
especialista em educação, ativista social e militante do MST