Cacau… O poeta plural

Pode ser só onda
pode ser só amor
pode ser só delírio
seja lá o que for.
Estes versos do poema “Calor” do poeta Cacau Novaes, diz bem de como devemos nos embriagar, nos enamorar dos poemas do livro Você não sabe do que é capaz, que mostra ser bem capaz de nos emocionar com a força e o lirismo que só a poesia pode nos propiciar.
Cacau, nos 117 poemas, aborda o amor e as relações amorosas em suas dimensões sensual, sexual, erótica e conceitual, “O amor também tem que ter prazer: / o prazer de transcender”. Neles, podemos sentir ecos de Luís de Camões, a eloquência de Castro Alves, ressonâncias de Vinícius de Moraes, além da sutileza de Caetano Veloso e o derramamento de Cazuza. O poeta dialoga com os poetas do cânone literário e com os poetas da música popular brasileira. O poeta não tem amarras, não se aprisiona em rótulos, não estabelece fronteiras: é simplesmente plural!
“Todas as cartas de amor são ridículas”, já nos dizia o poeta português Fernando Pessoa, e vários destes poemas são ridículas cartas de amor, quando não bilhetes enamorados, descrição de des-encontros alucinados, ou desejos não realizados, “Eu queria poder te tocar. / Ao menos, sentir a tua pele”.
Cacau, como todo verdadeiro poeta, são vários e, como seu fruto homônimo, pode nos ofertar uma barra de chocolate amargo, como uma garrafa de doce mel, porque assim é a arte, assim é a poesia, a espelhar as diversas e distintas faces e fases do ser humano, da condição humana. Alguns poemas, tamanha a singeleza, nos faz lembrar algumas canções da bossa nova, “Eu, o mar, o sol / o barquinho e o horizonte / quando sinto a sua falta / e vejo as ondas tão altas”, não precisando de muito esforço para escutar o piano de Tom Jobim ou o violão de João Gilberto.
Eis que surge do outro lado, um Cacau libertário e libertino, que, assim como o poeta francês Arthur Rimbaud, vai num “barco bêbado” de encontro às convenções do bom tom literário, “Eu quero beijar muito / chupar sua língua / trocar cuspe”.
O poema é o strip-tease mental do poeta, nos disse a poeta Myriam Fraga, e o poeta nascido na cidade de Iguaí, leva isto aos extremos e expõe suas vísceras, não se rendendo à (auto) censura. Como todo verdadeiro poeta, não aprisiona seus pensamentos, ao revés, deixa-os livres ao vento.
Cacau, com seu desprendimento, não tem receio de alçar voos como um condor, “E se for tudo / uma ilusão, / um sonho, / somente um filme, / ficção”, não tendo medo de errar, de ser no jogo, um feliz perdedor, “pensando ser caçador / e virando caça / do seu amor”, pois como ele mesmo diz, “Sexo / Cheiro de sexo / no ar. / Nexo / não é preciso / para amar”.
Escrevi no início deste texto, que os poemas deste livro são cartas, bilhetes, recados, avisos, porém posso dizer também, que, em alguns momentos, são intimação, “Vou entrar em todo o seu corpo / percorrendo suas entranhas, derrubando preconceitos”, em outros, um grito de socorro, um pedido de salvação, “A vida é um perigo / e eu procuro abrigo / para o meu coração”.
Cacau, artista performático a recitar seus poemas e de outros autores nos mais variados espaços, nos brinda agora com mais este livro de poemas, uma verdadeira Ode ao Amor. Só tenho que agradecer e reconhecer que ele continua fiel ao seu poema, publicado em seu primeiro livro de poesia, Os Poetas estão vivos, poema que é, na verdade, um testamento, um testemunho, não apenas dele, mas de todos nós, amantes da poesia e do amor.
Sentarei embaixo daquela árvore solitária
para compor versos
e lá do alto, daquele morro,
eu verei que eles, os poetas, estão vivos.
Por Douglas de Almeida