Musa trans vai desfilar em 4 escolas de samba: ‘Eu venci, a comunidade trans venceu, estamos aqui e vamos ocupar todos os espaços’
Camila Prins conta que antes de ser aceita pela comunidade, componentes da bateria de escola Camisa Verde e Branco fizeram greve quando ela foi coroada em 2018. Ela é considerada a primeira madrinha transexual de uma escola do Grupo Especial, a Colorado do Brás.
Camila Prins, 40, vai enfrentar uma maratona digna de atleta para desfilar em 4 escolas de samba no carnaval 2020. O marco tem um gostinho a mais: ela é a primeira madrinha de bateria transexual LGBT do Grupo Especial no carnaval de São Paulo.

Camila Prins é a primeira madrinha transexual de uma escola de samba do Grupo Especial do carnaval — Foto: Celso Tavares/G1
O posto é na Colorado do Brás, mas Camila também vai desfilar no Grupo de Acesso como madrinha da Camisa Verde e Branco, musa da Unidos de Santa Bárbara, do Grupo de Acesso 2 e musa da União Imperial, escola de Santos, no litoral de São Paulo.
Camila também desfila na Suíça. Ela conta que recebeu um convite para participar do Festival Internacional de Samba realizado na cidade de Coburg, o 28° Internationales Samba-Festival Coburg 2019. Camila é rainha da escola de samba suíça Unidos de Lauzane.
“Quem é do samba sabe como é difícil conquistar este espaço. Ainda mais no Brasil, o país que mais mata LGBTs no mundo. Foram 20 anos de samba para estar aqui, e com o respeito das escolas e suas comunidades. Tenho recebido muitas mensagens dizendo que eu inspiro muitas outras mulheres trans a chegar onde cheguei”, afirma Camila.

Camila Prins é a primeira madrinha transexual de uma escola de samba do Grupo Especial do carnaval — Foto: Celso Tavares/G1
O Brasil é o país que mais mata travestis e transexuais no mundo. A expectativa de vida é de 35 anos, menos da metade da média nacional, que é de 75 anos, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em junho do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu permitir a criminalização da homofobia e da transfobia.
“Me sinto vitoriosa. Eu venci, a comunidade trans venceu, estamos aqui e vamos ocupar cada vez mais todos os espaços”, afirma.
Durante três anos, de 2002 a 2004, Camila conta que desfilou nas escolas cariocas Porto da Pedra e Império Serrano sem contar que era transexual.
“Tinha medo de me bloquearem e não me deixarem desfilar. Minha estilista, que foi quem me levou, disse que não era para eu conversar muito, só me apresentar como Camila. Só fui bater no peito e dizer que sou trans quando entrei na frente da bateria em 2018”, relembra.
Para Camila, ocupar esse espaço no carnaval não foi fácil. Ela conta que os componentes da bateria da escola de samba Camisa Verde e Branco chegaram a ameaçar de fazer greve quando ela foi coroada madrinha da escola, em 2018.

Camila Prins é a primeira madrinha transexual de uma escola de samba do Grupo Especial do carnaval — Foto: Celso Tavares/G1
“Me eram negadas as oportunidades. Em uma reunião de destaques da Camisa eu comentei com a diretora Magali Tobias, filha do fundador, porque não uma rainha transexual na frente da bateria. Foi aí que ela me coroou. No dia seguinte os componentes queriam fazer greve porque não me queriam na bateria. Sempre pensam que trans é marginal, drogada, acharam que eu ia dar trabalho. Mas a Magali bateu o pé e falou que eles tinham que se preocupar com a nota 10 e não com o quem estava na frente da bateria. Mas isso Foi um primeiro momento, depois me aceitaram e hoje me dou super bem”, relembra.
Na Colorado do Brás, Camila não enfrentou resistência, já que 40% dos componentes são LGBT.
Para encarar a maratona, Camila tem tido aulas de samba com a professora Maiara Santos, estética, drenagem e massagem e muito tratamento facial.
“Não economizo, me preparei para esse momento para mostrar que a gente pode estar em qualquer posto como rainha ou musa e sempre bem produzida”, afirma.