121 crianças na Bahia querem um lar de presente

Ter um lar. Uma casa, pais, irmãos, tios, primos, e com alguma sorte, um cachorro ou um gato. Pedidos assim podem parecer triviais para a maioria das pessoas, mas para 121 crianças na Bahia, seria o melhor presente que poderiam ganhar.
A.C tem 14 anos, mora na Organização de Auxilio Fraterno (OAF), ela chegou lá com 9 anos, e, hoje, não tem esperanças de conseguir um lar. É que a maioria das pessoas buscam crianças de 0 a 6 anos. A.C já se prepara através de cursos para o dia que completará 18 anos e terá que ir embora. “Sem pais ou familiares, ela vai estar sozinha no mundo. Por isso, a instituição pede, na esperança de obter alguma ajuda, um trabalho para ela, ou uma forma de pagar um aluguel, não abrimos a porta e simplesmente mandamos sair, não conseguimos, nos apegamos àquelas crianças”, explica a coordenadora do local, Cleidineia Carvalho.
Com mais sorte do que ela, um menino de 10 anos saiu da instituição há um mês diretamente para um lar. “Ele tinha pais alcoólatras e drogados, fazia pequenos furtos, um dia ele parou no meio da estrada e tentou se matar, abrindo os braços na frente de um caminhão, aí foi trazido para cá. Hoje, ele foi adotado por um rapaz que se encantou com ele, tem um lar, passa por acompanhamento psicológico e pedagógico, é feliz,” conta Carvalho.
Sentindo na pele a rejeição, pela segunda vez (a primeira vez pela mãe, aos sete meses, e a segunda, agora, aos seis anos), um dos meninos do abrigo precisa de acompanhamento psicológico para entender por que ninguém o quer. O problema? Ele é danado. “Ele chegou a ser adotado e a família desistiu. Ele é danado, pintão, coisas da idade, e as famílias que vêm aqui acham que vão encontrar a criança perfeita. Resultado, eles devolvem a criança. Ele passou um mês lá, veio nos visitar e contou que tinha um pai e uma mãe, irmãos e depois voltou falando que foi rejeitado novamente. Com isso, parou de falar, voltou a fazer xixi na cama. As pessoas que vêm aqui têm que entender que estão lidando com os sentimentos de pequenos anjinhos,” diz a coordenadora da OAF, Cleidineia Carvalho.
Outro fator facilmente encontrado são as crianças que são retiradas da posse da família, por questões de vulnerabilidade social. Passando por essa situação, estão oito irmãos, a mãe é alcoólatra e não tem condição de cuidar deles. O menor tem um ano, o mais velho, 12. Eles vão continuar no lar, até que a mãe se recupere e o juiz entenda que ela tem condição de cuidar das crianças. Na maioria das vezes, esse momento nunca acontece.
De acordo com o juiz da 1ª Vara da Infância e da Juventude, Walter Ribeiro, existem 121 crianças aguardando adoção na Bahia, 57 delas são meninas e 64 meninos, entre idades de 0 a 17 anos. No estado, existem cerca de 253 pessoas interessadas em adoção, o grande problema, é que essas pessoas buscam crianças especificas. “As pessoas querem as crianças para colocar na vitrine, o preconceito ainda é muito grande. Então eles buscam bebês, meninas, brancas do cabelo liso. E isso é completamente diferente da realidade do estado. Nós temos para oferecer meninos negros, muitos deles já crescidos, com 10 anos, e eles, ninguém quer adotar,” explica Ribeiro.
235 interessados estão na fila de espera
Além disso, as crianças que possuem necessidades especiais nem entram na luta por uma casa. “Temos uma instituição com mais de 100 crianças de 0 a 17 anos, com o cérebro exposto, e nunca vão sair de lá, por que ninguém quer. Como ninguém quer uma criança com AIDS, ou filhos de drogados, elas ficam lá, esquecidas. É o preconceito que está enraizado na cabeça da sociedade,” conta o juiz.
Apesar de não existir lei que obrigue que a adoção seja feita por casais, a maior parte delas, ainda é realizada dessa forma. Segundo o Juiz da 1ª Vara da Infância e da Juventude, Walter Ribeiro, os solteiros e os homossexuais são poucos na fila. “Dos 235 cidadãos que estão habilitadas para adoção, apenas cinco são homossexuais. Isso por que muito deles preferem se apresentar como héteros e solteiros, ao invés de gays casados, eles acham que vão sofrer algum tipo de preconceito, mas isso não existe. Independente da opção sexual de cada um, o que é avaliado aqui é o bem-estar das crianças”, pontua Ribeiro.
As principais causas que levam crianças às instituições são: abandono, família envolvida com drogas, maus-tratos, abuso sexual e negligência. Hoje, no estado, existem 1.391 crianças em abrigos.
O que é preciso fazer
Qualquer pessoa maior de 18 anos, independentemente do estado civil, pode adotar. As únicas proibições são para os ascendentes e os irmãos do adotando. O interessado deve provar que o menor não irá sofrer qualquer privação, apresentando condição financeira para sustentar a família, o juizado chama atenção ainda, que não é necessário uma condição financeira maravilhosa, basta garantir as necessidades básicas do pequeno. O candidato a adotar pode ser casado, solteiro, homossexual ou hétero, mas não pode ter antecedentes criminais. Ele deve gozar de boa saúde física e mental, além de apresentar comprovante de residência.
Após cumprir os pré-requisitos, o interessado passa por uma avaliação psicossocial de uma equipe técnica, entrando, assim, no cadastro de habilitados. A análise também inclui a avaliação do imóvel em relação à condição física para receber mais um novo morador.
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Por Tribuna da Bahia